Uma noite muito muito estrelada.
de Jimmy Liao, SM Educação.
Lia-se pouco na casa de Lina, uma casa com pai e mãe e um irmão mais novo. Seu livro preferido era o de um peixe, poucas páginas e ilustrações literais, além dele alguns gibis e revistas de produtos de beleza:os livros da biblioteca da escola permaneciam distantes dentro dessa casa.
Era muito difícil para a Lina acompanhar as leituras e construir os sentidos, as pontes entre as palavras e as coisas. Percebendo isso, sua professora a indicou para participar de um projeto de leitura dentro da escola, onde um voluntario leria com ela e a acompanharia nesse processo por um ano. Foi assim que eu a conheci.
No primeiro encontro eu costumo levar vários livros de vários formatos, com diferentes assuntos pois não sei que leitor eu irei encontrar. Esse momento é sempre um pouco tímido, eu começo a me apresentar, conto alguma história sobre a minha relação com os livros, mostro tudo que eu trouxe e convido Lina a escolher algo para lermos juntas.
Lina escolheu um livro com pouco texto. Leu truncadamente cada uma das palavras, se perdendo ao mudar de parágrafo, ao virar a página, em um mero decifrar de letras. Nosso tempo acabou aí, e fui para casa com o desafio de pensar em um livro que a tirasse desse lugar tão árido.
Minha escolha foi Uma noite muito muito estrelada, de Jimmy Liao, publicado pela editora em que eu trabalho, SM Educação.
Achei que precisaria levá-la para um lugar bem diferente de onde ela estava e tentar outras conexões de sentido. Nesse livro as imagens são inspiradas no movimento estético-literário do Surrealismo, e a obra em si é inspirada no movimento literário do Realismo Mágico.
É um livro de pouco texto, e eu imaginei que isso não a intimidaria. A narrativa visual, por tomar um lugar central, amplia os sentidos, a imaginação e suas habilidades leitoras. Tinha esperanças de que ela encontraria alguma “ponte” ali, ainda mais em se tratando de uma obra de um dos mais conhecidos ilustradores-autores da Ásia.
Jimmy Liao publicou vários livros, foi vencedor de vários prêmios internacionais e suas obras também foram adaptadas para cinema, teatro, televisão e animações.
O livro foi um sucesso. Conforme ela foi descobrindo as mensagens e as camadas de informação e sentidos ali presentes, foi se sentido mais confiante. Nada está ali á toa. Cores, traços, passagem do tempo, referências artísticas. O título, como você já deve imaginar, dialoga com a obra Noite Estrelada, do Vicent Van Gogh. E agora Lina tinha fôlego e valentia para continuar.
Depois desse título, fomos migrando para outros onde a narrativa textual passava a ser predominante, e ela migrou de um lugar para o outro com muita facilidade.
Muito se fala no processo de alfabetização, dos caminhos, métodos e livros relacionados a ela mas pouco se fala da alfabetização de imagens ou alfabetização visual.
Ler imagem é tão importante para o repertório da criança quanto o vocabulário e técnica de escrita. Saber diferenciar as linguagens plásticas e as intenções estéticas de uma ilustração, ou de um conjunto de ilustrações, é ampliar as ferramentas para o leitor se aprofundar cada vez mais nas camadas de leitura, o capacitando a inferir com muito mais propriedade. Limitar o acesso ao sentido através de uma única possibilidade narrativa, a textual, é restringir ou retardar esse vínculo para o leitor que nem sempre vê nessa ponte uma possibilidade próxima de leitura.
Myra, juntos pela leitura.
A Fundação SM trouxe em 2016, com a parceria da Comunidade Educativa CEDAC, a adaptação de um projeto de leitura originário da Catalunha, o programa Myra: juntos pela leitura, que se desenvolve com a compreensão de que a leitura é um importante caminho para o conhecimento de si e do mundo, além de configurar uma prática social capaz de ampliar as possibilidades de ação e intervenção no mundo.
Atualmente na versão online, o Myra continua fortalecendo e ampliando essa rede de voluntariado. Se você tem interesse em saber mais sobre esse projeto, acesse o site http://www.programamyra.org/